Fugir
para onde?
Pensando bem, até quando vou ficar fugindo do novo tipo de
infecção que surgiu na China no final de dezembro do ano passado e a velocidade
de sua proliferação já ameaça a população mundial? De epidemia passou
rapidamente a pandemia! Tenho que ficar lavando as mãos a todo instante, não
posso cumprimentar ninguém por aperto de mãos, andar de ônibus, estar ao lado
de quem espirra ou tosse, pegar em dinheiro, sair do Brasil nem pensar, nem ir
a manifestações de protesto. Eu teria que viver somente dentro de minha casa,
como se dentro de uma bolha? 
Então, vou procurar um isolamento de verdade, cem por cento
longe dos riscos de contrair o coronavírus. Vou, então, para outro planeta, decidi todo
contente! Todo entusiasmado, consegui contratar pela internet uma nave espacial
com destino ao planeta Marte. Olha que maravilha! No dia e hora marcados, lá
estava eu a viajar para um lugar que não tenha a menor chance dessas doenças
endêmicas que habitam nessa Terra.  
Chegando em Marte, eis que me deparo com alguns colegas
aposentados, felizes por estarem desfrutando os prazeres da qualidade de vida
na terceira idade, longe dos assaltos, do Congresso e do STF. É outro estágio
da vida; é a vida que todos deveríamos ter na Terra.
Após uma rápida conversa com meus colegas, dirigi-me à
praça para pegar um táxi, conforme orientação de um deles. Para minha surpresa,
os táxis eram do tipo Tonk Tonk, nome dado à charrete de um só lugar para
sentar, puxada por um chinês, muito usada na China. A praça, bonita e grande, estava
tão repleta de pessoas que até parecia uma manifestação contra os políticos de
lá. Só faltava essa! E num olhar mais atento, pude notar que uma parte era
composta por chineses e a outra por italianos, todos alegres, rindo alto e
contando piadas de ex-presidentes brasileiros. Pensando comigo mesmo: mas que
diabos eu vim fazer aqui? Talvez tivesse ido a um planeta mais distante...
Nesse momento, um filme começou a rodar em minha cabeça.
Lembro que a nave espacial, pelos escritos em sua fuselagem, era de fabricação
chinesa, e que a tripulação de bordo era, lógico, composta só por chineses. Eu
aqui, no meio da praça, entre um monte de italianos e chineses, que vieram me
cumprimentar e dar boas-vindas. Alguns tossindo e outros espirrando em cima de
mim, sem aquelas regrinhas básicas amplamente divulgadas nas redes de televisão
pelos profissionais da saúde no Brasil.
Imediatamente peguei um Tonk Tonk e pedi para me conduzir
até a nave espacial, que poderia me levar de volta para a Terra, e que afinal
de contas é um planeta nem tão perigoso assim, apesar da pandemia. Ao chegar lá,
a nave já havia saído e só voltaria de 30 em 30 dias. Não sei se o temível coronavírus
teria piedade de mim durante todos esses dias de espera da nave! Só sei de uma
coisa: o arrependimento tomou conta mim.
Comecei a me desesperar. Não é possível que isso seja
verdade! Já eram 6h da manhã... acordei dentro da bolha... aqui na Terra.
Celso
Pereira Lara
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